Nunca me imaginarei vazio, vazio sem o deleite do meu corpo aquecido
pelo som do silêncio à minha volta, à volta de um sussurro, sem um travesseiro
para partilhar, um cheiro, um sentir, um paladar. Sempre me imaginarei aproximando-me
de mim mesmo, avezado a estar só num sufoco onde sempre estou, a razão de eu
nunca ter sido, inexplicavelmente, uma pureza celeste ou a derrota de mim.
Vejo-me pisando destroços de mim entre gerações e lixo átono,
pisando o descanso da minha sombra, cansado de outras voltas dadas pela vida
plena de mentiras e atrocidades conscientes.
Desesperado sinto, aliso o meu corpo e nele alivio a minha
vontade de morrer, vigio as minhas olheiras tropeçando na realidade das
situações, afago um xantelasma e adormeço a minha voz. As palavras são aquilo
que eu não quero dizer.
Vigiando este estado latente de emoção, contorno a vontade de
partir e amo a triste realidade de existir, sinto-te a cada movimento dúbio e
tenso do meu cadáver e com ele vivo e me deito esperando o sol, circunstancia
de coisa alguma, vontade emergente, ocasionalmente modesta e banal, alma de
poeta frágil e tenso, constante interminável da vida.
Ensinaste-me a magia do sonho e fizeste-me acreditar que era
real, contudo sou figura deste presépio de natal que estaticamente recordará,
ano após ano, mais uma viagem ao destino impossível. Tilinto por dentro de um corpo
encarnado em mim e com ele vagueio nas ondas dos teus sentidos.
Afasto-me da dura realidade, da verdade plantada na percepção
do impossível e viverei segundo as regências do eternamente impossível.
Devo o dever indeclinável de me amar, sempre na esperança de
morrer antes de te ter na plenitude, sinto-me fraco de alma e forte de
espírito, sinto o ritual da paixão inexplicável por mim, ignoro-o, sempre com pensamentos
inapropriados, anti naturais, descarregados entre as confissões de mim e as de outro
alguém.
Fecho os olhos e vou sonhar na melhor maneira de pensar em
escrever alguma coisa, que acaba por não dizer coisa alguma.